A pacata cidade de Guariba, no interior de São Paulo, ficou marcada nacionalmente em maio de 1984 por um feito que revolucionou a história das leis trabalhistas no Brasil. Mais de cinco mil trabalhadores rurais, chamados de “boias-frias”, foram as ruas em busca de melhores salários, condições de vida e de trabalho. Localizada na região de Ribeirão Preto, forte potência sucroalcooleira, Guariba recebia migrantes vindos de todas as partes do país para a safra das usinas, visando o trabalho no corte da cana-de-açúcar.
A greve teve início em 14 de maio de 1984, quando os boias-frias bloquearam estradas e impediram o acesso de trabalhadores a cinco usinas da região. O dia 15, data a que se atribui o conhecido “Levante”, foi o momento mais violento das manifestações, boa parte tinha acabado de retornar do campo e os cortadores de cana estavam com o podão na cintura.
Reunidos em frente à igreja matriz de São Mateus, o que seria uma demonstração de desagrado contra os patrões virou correria, quebradeira e intervenção da Polícia Militar, que deixaram um morto e 40 feridos, três deles à bala. A greve foi declarada quando as usinas anunciaram a mudança de pagamento do corte da cana, aumentando de cinco ruas (medida do talhão) para sete ruas (linhas) de cana. Cada rua de cana, em média, tinha 1m40.
Com o aumento, os cortadores teriam que caminhar com a cana cortada mais 2m80. Isso significava um desgaste físico maior e menor produção. Os empresários, em contrapartida, economizariam no uso de caminhões e combustíveis. Os trabalhadores, pediam também a criação de um piso salarial, registro em carteira, fim dos “gatos”, os empreiteiros que os escravizavam, sem nenhuma condição legal de trabalho.
E também pediam transporte em ônibus, que deveria substituir o precário caminhão pau-de-arara, trabalho na entressafra (em outras lavouras) e o fornecimento de luvas, facão, podão, botas e meias. Exigiam também que pagassem às mulheres e aos maiores de 16 anos, o mesmo valor que os adultos recebiam por quilo de cana cortado. A greve durou quatro dias. Das 19 reivindicações feitas, 13 foram aceitas.
O secretário estadual do Trabalho da época, assinou em 20 de maio o documento que ficou conhecido como a “Carta de Guariba”, um marco importante nas relações de trabalho no campo. Em assembleia, no Estádio Municipal de Guariba, trabalhadores aclamaram o acordo e decidiram-se pelo fim da greve. Chegou-se a um acordo quanto ao pagamento pelo corte e fornecimento de material de e trabalho (botas, facões, podões, meias e luvas). Mulheres maiores de 16 anos passaram a receber pelo quilo da cana cortada o mesmo que ganhavam os homens. Apenas os menores de 16 anos, continuaram a receber 60% do valor pago aos adultos.
A luta travada em solo guaribense foi manchete nos principais noticiários do país, mostrando para a sociedade as condições desumanas sofridas pelos bóias-frias. Com isso trabalhadores rurais de todo Brasil, conquistaram condições dignas e humanas para exercer atividades que outrora, poderiam ser comparadas à escravidão.