Como o cinema nacional está reconquistando o mundo

Por Amanda Maestre, João Pedro Turati, Kaelaine Olive e Lívia Louzada

O cinema brasileiro está, mais uma vez, de pé e, agora, aos olhos do mundo. Depois de anos marcados por cortes, retrocessos e descaso com a cultura, o país volta a ocupar espaço nos principais festivais internacionais e nas premiações mais prestigiadas do planeta. E não é à toa: a temporada 2024-2025 tem sido uma das mais promissoras para o audiovisual nacional. O sucesso de Ainda Estou Aqui, dirigido por Walter Salles e coroado com o Oscar, é apenas a ponta de um iceberg artístico que começa a emergir com força.

“É notória a luz acesa que o longa de Walter Salles deixa para o nosso cinema”, diz Eduarda Monteiro, crítica e pesquisadora de cinema. Para ela, obras como O Agente Secreto e O Último Azul também refletem essa nova onda, fruto de um ambiente mais favorável à cultura: “É o reflexo de um país, de um governo, que se importa com a sua arte”.

Quer saber a opinião das pessoas sobre o cinema nacional e o que ele representa para a cultura brasileira? Confira neste vídeo:

Mas o que torna esses filmes tão brasileiros em suas raízes e, ao mesmo tempo, tão globais em sua recepção? Segundo Monteiro, a resposta está na nossa singularidade: “A diversidade das nossas obras e nosso olhar único. Nossa forma de ver o mundo e projetar isso na arte”. Esse jeito genuíno de narrar histórias conectadas ao Brasil e ao mundo, um país onde a cultura pulsa, mesmo quando retrata suas dores.

No caso de Ainda Estou Aqui, inspirado na história da família Paiva, o reconhecimento internacional foi construído sobre uma narrativa sensível, porém potente. “Não é apenas sobre os horrores da ditadura militar, mas sobre família e afeto. É uma luta movida por amor”, resume Monteiro. A atriz Fernanda Torres, que interpreta Eunice Paiva, entrega uma atuação que a crítica descreve como “visceralidade silenciosa”: uma personagem que, mesmo em silêncio, grita por justiça.

Além da temática universal, a linguagem de Walter Salles também foi decisiva. Ele escolheu uma abordagem que privilegiou o afeto e os íntimos, tornando o filme uma história universal. Monteiro ressalta a diferença de olhares entre Ainda Estou Aqui e O Agente Secreto, mesmo que ambos tratem da ditadura. “Essa história poderia ter outro ponto de vista se não fosse construída por Salles”.

Ela também pontua os limites dessa representação: Ainda estou aqui foca numa família branca, de classe alta, da zona sul do Rio de Janeiro dos anos 1970. “Essa é a classe representada. Mas o longa também simboliza muitos mortos e desaparecidos da ditadura por meio da figura de Rubens Paiva”.

No infográfico abaixo, confira de que forma as pessoas se relacionam com o cinema brasileiro:

A presença do Brasil em premiações como o Oscar sempre levanta discussões sobre diversidade. Monteiro vê avanços, embora ainda distantes do ideal. “Ainda falta muito para que o Oscar seja inclusivo como poderia. Mas hoje há menos barreiras que no passado”. A divulgação intensa de Ainda Estou Aqui, com o elenco viajando internacionalmente e o filme em longa circulação, também foi crucial. “Nem sempre o melhor filme vence, mas faz com que ele seja visto”.

Embora o filme tenha sido financiado com recursos do próprio diretor, Monteiro afirma que as políticas públicas e os editais são essenciais para a maioria dos profissionais. “Cinema é entretenimento, mas também é memória, trabalho e direito”.

O impacto foi real. “O país vibrou como se fosse a final da Copa do Mundo”, lembra Monteiro. Não apenas pela vitória, mas pelo que ela representa. Ou seja, um novo fôlego para criadores que seguem resistindo. “Nossa arte tem valor, importa e merece ser vista”.

A recepção crítica internacional foi positiva, mas, segundo Monteiro, o olhar brasileiro capta camadas mais profundas. “Conseguimos analisar a ditadura com nuances que fogem à maioria dos críticos estrangeiros”. E o que o filme ensina a quem sonha com o cinema? A resposta é clara: “Acreditar, trabalhar e resistir”.

Quer saber mais sobre o cinema nacional? No nosso podcast, recebemos duas convidadas especiais: Ísis Sthefani, que analisa o cenário atual do audiovisual brasileiro:

E Karina Rodrigues, que traz a sua visão sobre a recepção do cinema nacional em Portugal: